Execução Imediata da Pena no Tribunal do Júri: Reflexões Sobre a Expansão do Poder Punitivo e as Garantias Constitucionais
- Piva Advogados
- 20 de set. de 2024
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O Supremo Tribunal Federal decidiu por maioria ser possível a execução imediata da pena para pessoas condenadas pelo Tribunal do Júri imediatamente após prolatado o veredicto, ainda em primeiro grau.
A decisão reflete a tese sustentada há alguns anos pelo ministro Luis Roberto Barroso, no sentido de que a condenação no Tribunal do Júri abala fortemente a presunção de inocência, em razão da previsão constitucional de soberania dos veredictos, a qual autoriza o imediato cumprimento da pena.
Segundo o entendimento majoritário, a previsão constitucional da soberania dos veredictos, prevista no artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea c (quanto à "soberania dos vereditos"), da Constituição, justificaria o início do cumprimento da pena ainda em primeira instância.
Por outro lado, ao permitir a prisão imediata, a decisão amplia o alcance punitivo, o que contraria o sentido original da norma, que visa a limitar o poder do Estado sobre as liberdades individuais.
Outro ponto relevante é a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário. O artigo 8º, item 2, estabelece que toda pessoa tem direito à presunção de inocência até que sua culpa seja legalmente comprovada, incluindo o direito de recorrer a uma instância superior. A execução antecipada da pena pode ser vista como uma violação desse princípio, uma vez que, ao iniciar o cumprimento da pena antes do julgamento dos recursos, o direito ao duplo grau de jurisdição perde efetividade.
Além disso, a decisão cria uma assimetria no tratamento dos recursos. Enquanto a acusação pode recorrer para contestar uma absolvição, sem que a soberania dos veredictos impeça essa revisão, o réu condenado no Júri terá que cumprir a pena imediatamente, mesmo que a decisão possa ser revertida posteriormente.
Por fim, é importante considerar o impacto dessa decisão no sistema prisional. A execução imediata da pena, sem uma estrutura adequada para absorver um possível aumento no número de encarcerados, pode agravar ainda mais a crise no sistema penitenciário brasileiro, além de gerar danos irreversíveis aos condenados que venham a ser absolvidos posteriormente em sede recursal.
Apesar do respeito à decisão dos ministros, que são fruto de intensos debates e análises, é igualmente importante refletir sobre os impactos dessas decisões, principalmente quando envolvem a ampliação do poder punitivo do Estado e a possível mitigação de garantias constitucionais como a presunção de inocência.
A decisão de permitir a execução imediata da pena no Tribunal do Júri, embora amparada na interpretação da soberania dos veredictos, deve ser cuidadosamente avaliada à luz dos princípios que orientam o sistema de justiça, especialmente os direitos humanos e o direito ao duplo grau de jurisdição. A reflexão sobre essas questões não diminui o respeito à decisão, mas ressalta a importância de ponderar sobre seus efeitos práticos e jurídicos, buscando sempre o equilíbrio entre a proteção da sociedade e a salvaguarda das garantias fundamentais.
Referência:
Julgamento do RE 1.230.340/SC, com repercussão geral
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