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IR Único de 17,5% para Investimentos: o que muda e quem ganha (ou perde) com a nova MP

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1. Introdução

A Medida Provisória nº 1.303/2025, parte do pacote fiscal do Governo Federal, propõe uma alteração no regime de tributação dos investimentos financeiros ao instituir uma alíquota única de 17,5% sobre os rendimentos de aplicações em renda fixa, fundos de investimento, ações e criptoativos, com vigência projetada já para o exercício de 2026.


Trata-se de mudança relevante na sistemática do Imposto de Renda incidente sobre ganhos financeiros, atualmente regulada por tabelas regressivas, que variam conforme o prazo de aplicação, privilegiando o investimento de longo prazo. A proposta, portanto, suscita questionamentos quanto à isonomia tributária, ao princípio da capacidade contributiva e aos efeitos econômicos e jurídicos decorrentes da uniformização das alíquotas.


2. O modelo atual e a proposta de unificação

Atualmente, os rendimentos de aplicações financeiras seguem as regras previstas na Lei nº 11.033/2004, no Decreto nº 9.580/2018 (Regulamento do Imposto de Renda) e nas normas complementares da Receita Federal do Brasil, que tratam tanto das aplicações de renda fixa quanto das de renda variável.


No regime vigente, a tributação das aplicações de renda fixa é feita conforme uma tabela regressiva, que varia de acordo com o prazo de permanência da aplicação:


  • 22,5% para resgates até 180 dias;

  • 20% para prazos de 181 a 360 dias;

  • 17,5% para prazos de 361 a 720 dias;

  • 15% para prazos superiores a 720 dias.


Essa lógica busca incentivar o investimento de longo prazo, ao mesmo tempo em que impõe maior tributação sobre operações de curto prazo e especulativas.


Em relação à renda variável, os ganhos líquidos auferidos em operações com ações são, atualmente, tributados conforme o regime previsto na Lei nº 8.981/1995, no art. 2º da Instrução Normativa RFB nº 1.585/2015 e no art. 2º da Lei nº 11.033/2004, com as seguintes regras:


  • 15% sobre o ganho líquido em operações comuns;

  • 20% sobre o ganho líquido em operações de day trade;

  • isenção para vendas de até R$ 20.000,00 por mês em operações no mercado à vista.


A MP 1.303/25, no entanto, extingue a progressividade temporal e propõe alíquota única de 17,5%, aplicável à generalidade das operações financeiras, incluindo fundos de investimento, ações, e criptoativos, preservando apenas algumas isenções específicas — como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas.


O texto ainda prevê a substituição da isenção mensal de R$ 20.000,00 por uma isenção trimestral de R$ 60.000,00 para alienações em renda variável, e a elevação da alíquota incidente sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP) de 15% para 20%.


A unificação de alíquotas, portanto, embora simplifique a mecânica de apuração, elimina o caráter extrafiscal da tributação sobre investimentos, desincentivando o alongamento dos prazos de aplicação e a capitalização de longo prazo.

3. Fundamentos e justificativas do governo

Segundo a Exposição de Motivos da MP, a proposta visa:

“Simplificar a tributação, reduzir distorções entre modalidades de investimento e aumentar a neutralidade fiscal do sistema, assegurando maior previsibilidade e equidade na carga tributária.”

Em outras palavras, o objetivo declarado seria eliminar a assimetria tributária entre ativos de renda fixa e variável, uniformizando o tratamento fiscal. Contudo, ao analisar a questão sob o prisma jurídico-tributário, percebe-se que a neutralidade não necessariamente se confunde com justiça fiscal.


4. A perspectiva jurídica: neutralidade x capacidade contributiva

O princípio da capacidade contributiva, previsto no art. 145, §1º, da Constituição Federal, impõe que os tributos sejam graduados segundo a potencialidade econômica do contribuinte.


A aplicação de alíquota única, por sua vez, ignora a diversidade de situações econômicas subjacentes a cada tipo de investimento, o que pode conduzir a uma violação indireta da isonomia tributária (art. 150, II, CF).


Na doutrina, Ricardo Lobo Torres (in Tratado de Direito Financeiro e de Direito Tributário, 2013) lembra que a justiça fiscal se realiza “quando o tributo leva em conta as circunstâncias e a natureza do fato gerador, e não apenas a igualdade formal do contribuinte perante a lei”. Assim, uniformizar sem considerar o perfil econômico de cada operação pode gerar desigualdade material entre investidores.


Além disso, a unificação da alíquota tende a desincentivar o investimento produtivo de longo prazo, contrariando diretrizes econômicas de fomento ao financiamento privado de projetos estruturantes, em especial os ligados ao mercado de capitais e à infraestrutura.


5. Efeitos práticos sobre diferentes aplicações

5.1 Renda fixa e Tesouro Direto

Com o fim da tabela regressiva, o incentivo temporal é suprimido, o que impacta diretamente produtos como CDBs e Tesouro Direto, tradicionalmente associados a objetivos de poupança de longo prazo. Todos pagam 17,5%, independentemente do prazo.


5.2 Fundos de investimento

Os fundos de investimento mantêm o mecanismo de come-cotas, que antecipa semestralmente o pagamento do imposto sem esperar o resgate.


5.3 Ações e Juros sobre Capital Próprio

A unificação atinge também o mercado de ações. A proposta unifica em 17,5% a tributação sobre ganhos com ações (inclusive day trade) e eleva de 15% para 20% o IR retido sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP). A isenção mensal de R$ 20 mil também seria substituída por uma isenção trimestral de R$ 60 mil.


5.4 Criptomoedas

A MP inclui ativos virtuais na base de incidência, tributando ganhos a 17,5% sem isenção mensal. Mas o texto cria uma janela de regularização para quem ainda não declarou seus ativos digitais, com alíquota reduzida de 7,5% até o fim de 2025.


5.5 Fundos Imobiliários (FIIs) e Fiagros

Mantêm a isenção de dividendos, desde que cumpram os requisitos de pulverização, e passam a ter IR de 17,5% sobre a venda de cotas, substituindo a atual alíquota de 20%.


5.6 LCI, LCA, CRI, CRA e Debêntures Incentivadas

Permanecem isentos, após forte resistência do mercado. O governo recuou da tentativa de tributar esses papéis.


6. Disposições finais

A criação de uma alíquota único para a tributação dos rendimentos de aplicações financeiras, como propõe a MP nº 1.303/25, representa um movimento claro de simplificação e uniformização do sistema tributário. Contudo, essa simplificação carrega efeitos colaterais relevantes, especialmente quando analisada sob a ótica do pacote de alterações propostas, e efetivas, na tributação, além da lógica da função extrafiscal dos tributos, ou seja, incentivar e desincentivar comportamentos.


Val lembrar que a a tabela regressiva aplicada à renda fixa, por exemplo, nasce da finalidade de desestimular operações especulativas de curtíssimo prazo e incentivar o investimento de longo prazo, incentivando a poupança e capitalização.


Retirar esta progressividade, portanto, tende a reduzir o diferencial de estímulo entre prazos de aplicação, se aproximando-se de uma lógica de neutralidade tributária, o que, por outro lado, enfraquece o caráter desenvolvimentista dessa política fiscal.


Nesta lógica, pensando no longo prazo, pode acabar resultando em uma redução na formação de poupança de longo prazo, e maior volatilidade nos investimentos (por meio de operações de curto prazo e/ou especulativas), diante da perda de incentivos à permanência.


Faria-se essencial, nesse cenário, uma política complementar voltada à educação e estímulo da poupança e capitalização de longo prazo, tanto como instrumento de crescimento patrimonial, quanto de planejamento financeiro individual.


A uniformização das alíquotas também pode impactar a arrecadação, exigindo do Estado uma calibragem, especialmente de estímulos extrafiscais, como debentures incentivadas e fundos de infraestrutura, para compensar eventuais desequilíbrios arrecadatórios e preservar o direcionamento dos investimentos produtivos.


Em síntese, a aprovação da MP 1.303/25, inaugura um novo ciclo de adaptação tributária, que requer planejamento e cuidado político.


 
 
 

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