Perspectivas e desafios para companhias abertas no Brasil (2025 → 2030+)
- Piva Advogados

- há 3 dias
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O mercado de capitais brasileiro vive um ciclo de maior cautela. Após o forte movimento de aberturas de capital em 2020 e 2021, a B3 passou por um período prolongado sem novas estreias relevantes, acompanhado por mais operações de fechamento de capital e reorganizações societárias. Esse cenário não é inédito: historicamente, IPOs tendem a crescer com juros mais baixos e maior liquidez, e a desacelerar quando o custo de capital e a aversão ao risco sobem.
Do ponto de vista empresarial, a leitura central é objetiva: o mercado não deixou de existir, ele ficou mais exigente. Em um ambiente de custo de capital elevado, as companhias passaram a priorizar alternativas de financiamento menos expostas ao humor da bolsa. Assim, a captação via dívida ganhou espaço, especialmente em setores com projetos de longo prazo e previsibilidade regulatória.
A resposta regulatória: reduzir custo e aumentar confiança
Nos últimos anos, a CVM e a B3 têm buscado modernizar o ambiente de mercado para tornar o ecossistema mais atrativo e funcional.
De um lado, a CVM atualizou as regras gerais de ofertas públicas com uma estrutura mais moderna, substituindo normas antigas e tentando dar mais previsibilidade ao processo de captação. De outro, lançou o Regime FÁCIL, focado nas Companhias de Menor Porte, com medidas para reduzir custos de conformidade e facilitar o acesso ao mercado, como exigências informacionais mais proporcionais e lógica de registro mais simples.
Em paralelo, a B3 vem discutindo melhorias no Novo Mercado para fortalecer temas como composição de conselho, independência, limites de acúmulo de cargos e mecanismos de auditoria e transparência. A mensagem é clara: atrair capital exige governança verificável e "enforcement" confiável.
Reforma tributária e produtividade: janela de médio prazo
A reforma tributária do consumo, com a transição para o IVA - imposto sobre valor agregado - dual (CBS e IBS), tende a reduzir distorções de cumulatividade e simplificar cadeias produtivas ao longo da implementação gradual até 2033. A unificação de tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) em um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) tornará o cálculo do imposto mais transparente, facilitando a visualização da carga tributária embutida nos preços.
A expectativa de melhoria de ambiente para investimentos produtivos é real, sobretudo para setores industriais e intensivos em cadeia de fornecedores, como o agronegócio e as empresas exportadoras, mas o ganho econômico depende de execução, tecnologia e aumento de produtividade. A expectativa com a reforma é de redução da cumulatividade de impostos e aproveitamento integral de créditos tributários, o que tende a reduzir o custo final de produção e aumentar a competitividade.
Isto será verificável pelos consumidores, já que os impostos serão destacados na nota fiscal.
Serviços de saúde, educação, alimentos, produtos de higiene, limpeza e agropecuários terão alíquotas reduzidas em 60%, o que pode resultar em preços menores para o consumidor final desses itens.
O ponto mais sensível para 2025-2026: litígios de investidores e responsabilidade de administradores
Se há um tema que deve mudar a forma como companhias abertas gerenciam risco jurídico, é o avanço de propostas legislativas e regulatórias voltadas ao enforcement privado.
O PL 2.925/2023 — que avançou na Câmara e seguiu para o Senado — busca ampliar mecanismos de proteção a investidores e modernizar a responsabilização por danos no mercado de capitais. Em termos simples, trata-se de uma tentativa de “tropicalizar” instrumentos de ações coletivas e ações derivadas, criando incentivos para que minoritários busquem ressarcimento de forma mais eficiente, sem descuidar do risco de litígios oportunistas.
Na prática, isso pode aproximar o Brasil de uma lógica em que a proteção do investidor não depende apenas do regulador, mas também de mecanismos de reparação civil mais funcionais. Esse movimento é coerente com debates internacionais sobre governança, transparência e responsabilização pós-crises corporativas.
Brasil x EUA
Nos EUA, as "class actions" de valores mobiliários são parte do sistema e influenciam diretamente "disclosure", governança e precificação de risco.
No Brasil, o caminho histórico foi mais centrado em arbitragem societária e atuação regulatória, com menor maturidade de demandas coletivas específicas de mercado de capitais.
A tendência atual é buscar um modelo intermediário: mais acesso à reparação, com filtros para reduzir litigância predatória.
O que isso significa para empresas
Para companhias abertas, e também para empresas que cogitam abrir capital no médio prazo, o foco estratégico deve ser:
Governança como ativo econômico: Conselho bem estruturado, independência real, comitês fortes e controles internos consistentes reduzem custo de capital e risco reputacional. As discussões do Novo Mercado apontam essa direção.
Gestão preventiva de litígios: O próximo ciclo de conflito tende a envolver informação ao mercado, deveres fiduciários e transparência contábil.
Estratégia de captação mais híbrida: Diante da janela estreita para IPOs, uma rota comum é combinar dívida, instrumentos incentivados e estruturas de governança que deixem a empresa pronta para uma abertura quando o ciclo macro melhorar.
Atenção às novas portas para médias empresas: Para companhias com base de receita compatível (faturamento anual até R$ 500 milhões), o Regime FÁCIL pode facilitar o acesso ao mercado e a crédito para desenvolvimento da companhia, de forma mais simples, barata e ágil, através de um arcabouço regulatório simplificado, como o Formulário FÁCIL, menos obrigações de divulgação (semestral, em vez de trimestral) e dispensas de relatórios, visando democratizar o investimento e financiar o crescimento de PMEs no Brasil.
Em resumo
O Brasil passa por um período de menor apetite ao equity, mas com duas forças positivas em construção:
modernização regulatória (para ampliar acesso e aumentar confiança), e
reorganização macro e tributária (com possível estímulo produtivo no médio prazo).
Do lado jurídico-estratégico, a principal mensagem é:
governança e transparência não são apenas compliance — são gestão de risco econômico e de litígios.



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