Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano
- Piva Advogados
- 30 de set.
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Atualizado: 2 de out.

Foi publicado, em 05/09, o Decreto Federal nº 12.614/2025, que regulamenta a Lei nº 14.993/2024 (Lei do Combustível do Futuro), instituindo metas de descarbonização para o segmento de gás natural com foco no uso progressivo do biometano e adotando o Certificado de Garantia de Origem do Biometano (CGOB) para assegurar rastreabilidade e transparência da cadeia.
Diretrizes principais
Produtores e importadores de gás natural (agentes obrigados)
Deverão adquirir biometano acompanhado dos respectivos CGOBs (ou CGOBs correspondentes) para cumprir a meta regulatória anual de redução de emissões.
O CNPE fixará, até 1º/11 de cada ano, a meta compulsória para o ano seguinte; a meta inicia em 1% em 2026 e não pode exceder 10% do volume total produzido ou importado. Pequenos produtores/importadores podem ser excluídos da base de cálculo, e há ajuste específico para gás usado em geração elétrica.
A ANP alocará as metas individuais até 1º/12 do ano anterior e disciplinará a alocação para os dois primeiros anos de operação de novos agentes. A comprovação do cumprimento da meta por cada agente deve ocorrer até 31/12 do ano de vigência.
Regras transitórias: para 2026 a meta será “pro rata” a partir da emissão do primeiro CGOB, com cobrança conjunta com a meta de 2027.
Produtores e importadores de biometano
Devem ofertar produto conforme normas da ANP, contratar agente certificador de origem e escriturador para emissão do CGOB. A ANP tem até 180 dias para regulamentar procedimentos de operacionalização.
O CGOB é emitido na proporção do biometano comercializado ou autoconsumido, mantido em contas individualizadas por entidades registradoras, e terá validade de até 18 meses; a ANP disciplinará a rastreabilidade, credibilidade e fungibilidade com outros certificados.
Integração com outros instrumentos climáticos
O decreto exige compatibilidade com outras políticas de redução de GEE, citando explicitamente a PNMC e o mercado regulado nacional (MBRE/SBCE ou equivalente), e permite descontar das metas regulatórias os CGOBs (e certificados fungíveis) aposentados no mercado voluntário.
Infrações e sanções
Preveem-se multa (R$ 100 mil a R$ 50 milhões, não inferior ao benefício econômico auferido), suspensão da emissão de novos CGOBs e cancelamento de CGOBs emitidos ilegalmente (sanções cumulativas). A ANP publicará anualmente percentuais de atendimento e sanções aplicadas.
Observações sobre a natureza do CGOB
O decreto distingue o CGOB de “créditos de carbono” e de CBIOs (RenovaBio): o atributo ambiental do CGOB não se confunde com instrumentos de compensação ou remoção de emissões. Isso é relevante para inferências tributárias (ver abaixo).
Tributação: CGOB x créditos de carbono (SBCE)
1) Créditos de carbono e ativos do SBCE (Lei nº 15.042/2024): A Lei do mercado regulado de carbono (SBCE) trouxe regras específicas:
IR/CSLL: o ganho na alienação de créditos de carbono e dos ativos do SBCE é tributado conforme o regime do contribuinte (ganhos de capital, ganhos líquidos em bolsa/mercado organizado etc.). É permitida a dedução de despesas de geração/certificação/registro dos créditos na base do IRPJ/CSLL (lucro real), e também quando houver cancelamento para compensar emissões.
PIS/Cofins: as receitas dessas alienações não se sujeitam a PIS/Cofins.
Conversão: a conversão de crédito de carbono em ativo do SBCE não configura fato gerador tributário.
2) CGOB (biometano)
Não há, no decreto, regra tributária própria para o CGOB. Além disso, o texto afasta a equiparação do CGOB a “crédito de carbono”/CBIO, o que indica que a não incidência de PIS/Cofins prevista na Lei 15.042/2024 não se aplica automaticamente às operações com CGOB (salvo enquadramento específico futuro). Até eventual norma federal tratar do tema, tendem a persistir debates já vistos com CBIOs/mercado voluntário (natureza jurídica do título; enquadramento contábil; incidência de PIS/Cofins e reflexos de IR/CSLL).
3) Reforma tributária do consumo (LC nº 214/2025 — IBS/CBS)
A LC 214/2025 institui o IBS/CBS e inicia a transição do sistema de PIS/Cofins/ICMS/ISS. O texto é geral e não trouxe regra específica para CGOB; a base dos novos tributos é ampla para bens/serviços, com desenho de neutralidade e não-cumulatividade. Em tese, sem lei específica, operações com títulos como o CGOB poderão ser alcançadas conforme sua qualificação (p.ex., serviço financeiro/ativo intangível), mas isso dependerá de regulamentações complementares e de como a CVM/ANP e a legislação infralegal venham a tratar a natureza e o canal de negociação do CGOB.
Conclusão:
• Créditos de carbono (SBCE): já contam com regime federal (IR/CSLL; sem PIS/Cofins; deduções e regras de conversão).
• CGOB: não há regra federal específica sobre PIS/Cofins/IBS/CBS; como o decreto separa CGOB de “créditos de carbono”, recomenda-se tratar a tributação do CGOB com cautela e acompanhar a regulamentação da ANP/CVM e eventuais normas da Receita Federal sobre a natureza jurídica e o tratamento fiscal do título.
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